quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Ladainha pra boi-dormir!

Fazia as coisas se aprofundarem mais divinamente, era de fato uma das minhas qualidades, minha imaginação fluía lentamente, como quem quisera conquistar o cabo das tormentas. E se deus não se fazia presente, era minha vez de abençoar a água que pungia minha vida de esperanças: a cerveja.
E todas estavam presentes ali, na minha frente, qual quisesse, entre o amor e a alma, o dilúvio no navio era quase que um dos destinos de Hitchcock. Há muito tempo não pensava em nada que pudesse desfazer minha sensação anestésica, as mulheres, as dividas, o sexo, a dor do corpo, mas chegava uma hora que bastava extirpar e extirpar a mim era a única coisa que não sabia fazer divinamente. Falta de coragem, talvez.
E bebia, a mesa cheia de garrafas vazias e eu pedia mais, e o garçom, muito meu amigo, trazia duas e cobrava uma, ele sabia o que eu passava, na verdade ele havia me dito que fazia isso porque tinha raiva do dono do bar, mais tarde descobri que o dono do bar era ele mesmo. E pensava que todas as pessoas, todos os seres humanos, tinham nojo de si mesmos em algum momento na vida, fosse pelo que fosse e fazia questão de cutucar a ferida pra que a coisa fosse mais realista. Você pode passar pela vida tocando sinos, ouvindo sermões, tentando seguir uma vida mais confortável e ter à frente um motivo pra acreditar que essa clausura é incontestável porque tens o céu logo adiante. Entre o inferno e o céu, qual? Ou você pode simplesmente esquecer tudo isso, deixar de lado, sentir-se bêbado pela cerveja que foi criada pelo homem mais filho-da-puta do mundo e que devo agradecê-lo até a morte. Sentir-se feliz pelas mulheres que desfilam nuas à sua frente na zona que freqüentas desde os seus dezoito anos e cada semana tem uma mulher diferente à sua espera. Você tem que passar a vida com seus problemas, é inevitável, porem, entre martirizar-se à espera do perdão divino e aproveitar enquanto há tempo na sua única chance de viver pra ser o que és de fato, o que fazes? Eis seu “eterno retorno” e Nietzsche há de concordar com essa ladainha dos infernos.

3 comentários:

Brenda.K disse...

Falar que gostei é pouco,mas acabei de chegar e estou cansada,preguiça ate de escrever.
então,gostei!
sou sua leitora assídua,sempre encontro bons textos por aqui.
beijos

Pati* disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Pati* disse...

Alguém disse, noutra postagem, que tens um 'blá blá blá de homem chato', concordo. Concordo e digo mais: chato-e-rabugento, de reclamar da vida ninguém escapa. Queria um amigo assim, a sorte não vem pra quem quer, fosse comigo, cogitaria até o fim os motivos da cerveja dada, por isso é melhor nem pensar mesmo, nem nos problemas, nem nas dívidas e muito menos nos fantasmas que cada um carrega vida afora, muito mais vivos que nós.
Eu já quis o céu, já o senti muito perto enquanto me privava de assumir que ser humano é um ciclo vicioso de idas e vindas inconscientes ao erro. E, se alguém me perguntar o que mudou longe da igreja, da dedicação e do temor extremo, responderei: nada. No fim das contas, tem sido até mais divertido hoje, sem querer saber de céu ou inferno, encaro as provações como únicas, quando se tem a rotina de um purgatório diário, cair a cada nova tentação é também uma forma de redimir-se.
Canso rápido de ensaiar meu existencialismo, vou deixar para exercitá-lo depois, talvez precise beber um pouco (muito) também, pois um bêbado nietzschiano, acho que nem eu aguento. :P