segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Foi, como foi!

Eu não era mais o mesmo homem da noite anterior. Acordara renovado, e entre poucas vezes, a cerveja não havia acabado com meu dia posterior. Acordara, um belo dia, ensolarado, havia brigado com qualquer pessoa, era a isso que minha vida se resumia, brigar, brigar, brigar... Fui à rodoviária, comprei uma passagem. Sei lá, qualquer lugar, o próximo ônibus, por favor, e fui.Deus, você não pode ser tão incólume assim, me ouça. Entrei no ônibus, uma moça loura, de belas pernas, ouvindo um funk carioca, com um short curto, as pernas pra fora, imaginei aquilo tudo rebolando num baile, desconcentrei, eu não queria e nem poderia me excitar aquela hora. Abri meu livro do Nelson Rodrigues, A Vida Como Ela É, e li, li muitos contos, todos incríveis, falando sobre machos e vagabundas, pois bem, minha vida estava voltando ao centro de mim e não de outra. Não de outros. Eu havia retomado o controle da situação. A loura tentou falar comigo, mas não dei bola, não gosto de mulheres atiradas. Chegando à cidade, havia um bar, uma cidade pequena, as pessoas se reuniam em um só lugar e ao que me parece, todos se conheciam. Um grupo de amigos bebendo cervejas de um lado, um outro senhor tomando sua dose de cachaça que tinha um valor fixado em um cartaz na parede: cachaça 51/velho barreiro; R$1,50! - Tirei algumas moedas do bolso, paguei uma dose para o senhor e pedi uma dupla pra mim, misturadas, velho barreiro e 51 e mandei pra dentro.Sentei-me à mesa ao lado de fora, o grupo de amigos reconhecera-me como um turista, ofereceram-me sua mesa, sentei-me, dois rapazes e um milhão de mulheres. Eu não podia ter mais sorte, Deus não era mais tão incólume assim. Perguntaram-me de onde era, o que fazia, eu não queria amigos, não novos amigos, seria muito trabalho pra alguem que estava somente a se aventurar em terras estranhas. Uma do grupo, esbelta, cabelos grande, claros, branca, como todo mundo parecia ser naquela cidade, brancos demais, pálidos demais, por isso eu preferia os negros, todos os negros me parecem mais dispostos à ventura, às emoções, no entanto, ela era linda, e sorria com os olhos, aquilo me cativava, tinha um vestido florido, suas pernas - e era isso que mais me atraía nas mulheres - estavam expostas e eu olhava, imaginava-me como um oleiro, com as mãos ali, ela em um torno e uma obra de arte sendo criada. Enfim, logo bebi outra dose de cachaça, por hora, não era isso que eu queria. Não era. Agradeci a companhia, havia um hotel ao lado do bar, despedi-me de todos e me indicaram o hotel por ser 'o melhor' e era tambem, fiquei sabendo depois, o único da cidade. Tomei um banho, tirei um cochilo, acordaria às 20hrs e isso era umas 18, para que os meus mais novos conhecidos e, consequentemente adversários, porque, ali no grupo, a moça que paquerei, parecia-me a mais assediada, tambem por isso não me empolguei muito, eram rapazes bonitos e endinheirados. E eu, com uma bolsa rasgada e roupa rota, não sobressairia. Às 20hrs o telefone do hotel toca, a recepcionista, Fabiana, informa: Boa noite, Sr. A sra tal lhe aguarda aqui embaixo. Eram os rapazes e as moças, não estava a fim de uma diversão, pensei em dormir mais, mas não, era uma moça bonita e valia o olhar. Desço,converso com a moça da recepção, era diferente da que havia me atendido, mudara o turno, Fabiana seu nome, olhos verdes, bonitos, um sotaque diferente, era assim que o interior me fascinava, suas mulheres, sua inocencia e suas bocas falando algo que eu não ouvia em qualquer lugar. Ainda que fossem as mesmas palavras de outras. Dou boa noite, me despeço, deixo a chave e quando saio na porta do hotel, esta lá, a moça, ainda mais bela que pela tarde, a luz natural, das estrelas, da lua, do verão, fez com que ela parecesse-um-milhão-de-sonhos-dentro-de-um-sonho-acordado. Mas havia um porém, ela estava sozinha... E eu não sabia se isso era bom ou ruim, porque eu não me controlaria mais! Perguntei se ela aceitaria uma pizza, o hotel oferecia o serviço, sugeri que comessemos no quarto, ela não hesitou, troquei a estadia de solteiro para casal e isso sim foi impactante. Subimos, conversamos, assistimos um filme, o hotel era realmente bom, a tevê era a cabo, havia um trem-fumaça na cidade, ela me contara os caminhos do trem, as fazendas que corta, os escravos que ja sofreram por ali. E só me lembro dos assuntos e não dos detalhes, porque agora havia tambem, um-milhão-de-palavras-e-caricias-dentro-de-uma-boca-tão-bela-quanto-os-olhos-que-sorriam. Segurei-a pelo cabelo... ... era a boca mais macia que ja havia beijado nos ultimos milhares de anos. Ela rubrou-se, mas não deixou de rir depois do beijo. Aquele riso que era fado, estava selado. Eu havia vencido os rapazes endinheirados e bonitos, talvez ela os preteriu, em troca do mistério e da aventura. A noite se deu como devia se dar, uma cidade pequena, o trem-fumaça triunfando a cidade, o barulho de um carro ou outro a cada meia-hora, os suores, o cheiro, a pizza fria e um 'tchau, preciso ir, Téo'. Fui ao bar, briguei mais um pouco com ninguem, bebi caipirinhas, chopes e ela ja devia dormir, feito princesa que era sorrindo e feito mulher que era tendo prazer. Eu não podia querer viver sempre assim, não se reduz a vida à aventuras, mas se um dia, ela aparecer de novo, aventuro-me, porque entre brigar e viver, prefiro viver, ainda que seja longe, ainda que seja caipira e ainda que o trem-fumaça me encha o saco a noite toda.

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