quarta-feira, 14 de abril de 2010

प्रिमिरो capíतुलों, इ daí?

Meio- dia e trinta, acabo de acordar, confesso que dormi sem escovar os dentes, tomei muito conhaque, minha boca amarga à espera do próximo, vou ao balcão, ao bar – como queira – e pego mais uma dose dupla, minha cabeça ainda roda, pela “manhã” a coisa é muito menos natural que à noite, não gosto de companhias quando acordo, eu seria capaz de cometer um crime sexual sem mesmo ter o sexo, estava à espreita, fui ao maço de Lucky strike e só havia um cigarro, acendi, normalmente, pelas manhãs os cigarros que eu fumava me deixavam tonto, esse era mais um. Sentei à mesa, uma mesa velha, com três pernas de ferro e uma de madeira, que improvisei quando caí em cima dela e quebrou semana passada, estava bêbado, pensei que fosse minha cama, a mesa já não era tão nova, se não quebrasse comigo, quebraria com um prato de comida, o próximo que eu colocasse ali em cima. Eu nunca colocava pratos de comida na mesa, lembrei que não comia há uns dois dias, nada, exatamente nada, sequer um petisco, salgado, salsicha, torresmo, qualquer coisa do boteco, não havia nada. Fui à dispensa, nada. Corri pro fogão e uma panela com uma raspa de arroz queimado, torrado, provável que havia esquecido no fogo, pela sorte da divina casa, o gás havia acabado, ou aquilo poderia ser pior.
Havia um sutiã em cima do sofá, duas calcinhas em cima da televisão, pelo que me lembro não trouxe ninguém ontem em casa, saí do bar, não me lembro pra onde fui, não exatamente, havia luzes, mas luzes havia em todos os lugares, era época de natal, aquelas merdas piscando pra todo lado, algumas vermelhas, verdes, azuis, brancas, que inferno era o natal, eu odiava ter que compartilhar a dissimulação alheia, apesar que eu era mais dissimulado que muitos, já havia conseguido comer algumas mulheres pela minha idéia sobre a fatídica vida.
Fui ao banheiro, ainda de cueca: filha-da-puta, quem fez isso com meu saco, caralho? A cueca melada de sangue, um corte artístico bem no meio do escrotal, lavei bem, porra, doía demais, parece que queriam levar minhas bolas de brinde, mas com a graça divina elas ainda estavam lá, era um corte superficial, acho que não me prejudicaria muito. Ah, eu pego quem fez isso, juro que pego. Joguei a cueca na pia, deixei de molho. Saí do banho, me sequei, havia lavado meu saco melhor que meu corpo, mas isso era praxe, talvez por isso ele tivesse mais valor pras mulheres que minha boca ou meu corpo. Coloquei as calças, minha carteira ainda lá, com os mesmos dinheiros míseros, meus documentos não, havia uma copia mal feita do RG, mas nada que pudesse durar o restante da minha vida, a não ser que tivessem me matado. Fui ao bar, cigarros, conhaque, ovos cozidos vermelhos, salsichas, torresmos, tudo dentro do mesmo saco de papel, pela manhã eu não reparava muito nas coisas ou nas pessoas: Joaquim, volto mais tarde pra acertar.

3 comentários:

Fogo na tigela. disse...

Não sabia que era você Xanis xará. rs. Espetáculo esse escritor né? Orgulho!

Fogo na tigela. disse...

Sumiu mas "anóis" põe de novo! rs

Muito orgulho de você meu amor, seu talento é incrível, dom divino, maravilhoso! Tem muita sensibilidade para a escrita e para a vida, o que de fato foi o que me encantou.

"É um milagre eu não me afogar com a tarde
Sou quem arde cego de
paixão
Abra a porta então
Deixe eu pensar que por ser assim sou
amado
Perdido ou desejado,
Estar contigo me faz tão bem"

Pati* disse...

"Primeiro capítulo."

Estava não só com preguiça de vir aqui comentar, mas também com um pouco de receio - continuo boba como sempre, meu bem. :) Mas vamos lá.

Já conhecia o texto, este já me foi apresentado como uma introdução, apenas o começo de uma trama prevista para ser algo maior... e realmente articula-se como tal. Um homem fora do comum, assim como todos os teus personagens, assim como você próprio, o que leva aqueles que acompanham seu trabalho a cair no mesmo dilema de sempre: personagem-autor ou autor-personagem? Lembro-me bem que você mesmo me disse que tua vida não era uma ficção. Acho que tive (tenho?) sorte de manter proximidade com uma criatura tão complexa e, até me atrevo a dizer, encantadora, mas isso em nada parece ajudar numa compreensão ou tentativa de interpretação de autor ou obra. Assim como você não se restringe a uma possibilidade única de leitura, o mesmo se aplica à tua obra, quem quiser se guiar por preceitos como moralismo, puritanismo e viés de hipocrisia poderá se limitar a ver apenas um sórdido homem, sem moral, sem promessas de fé ou compromisso, mas só quem se arrisca a ampliar sua visão e entender essa mitificação de homem como fuga e ao mesmo tempo existência, realidade, poderá enxergar a doçura de que Ana da Cruz fala, em tudo isso e por tudo isso de que tratam essas linhas promissoras.

Me excedi nas falas, domingo é para mim o dia mais entediante - somente uma leitura tua - bálsamo da instiga.

Beijo, fica bem :)