Não estava tão feliz daquela vez, sentado num canteiro, à beira do posto de gasolina, enquanto passavam travestis e prostitutas, estava na décima nona lata,esperava a vigésima e iria pra casa, havia um pouco, o suficiente pra dois goles, queria um amor, amar era dificil, queria ser feito aqueles idiotas lá no canto, amississímos de todas as mulheres do posto, dançando funk, indo até o chão, rebolando nas pontas dos cascos, belas éguas, vadias, a revolta com elas talvez fosse porque davam bolas pra eles, não pra mim.
Sentia-me feio, havia ficado com tantas mulheres, fui de tantas outras mulheres, a maioria feia, confesso. Tive umas bonitas, duas ou três lindas de morrer, não tinha mais. Meus olhos deviam estar vermelhos, no caminho havia visto dois rapazes morrerem n'um acidente de carro, minha cabeça pesava, a cena foi feia, eu tinha ódio de Deus, eu tinha ódio de mim e daquelas vacas dançando bonde do tigrão porque queriam dar pra eles e não pra mim.
- Alô!
- Téo, aonde você está?
- Bebendo.
- Vem em casa, comprei algumas cervejas, há uns dois ou três filmes, vamosassistir.- Não quero filmes.
- Como você está?
- Vestido, e você, nua?
- Como você é deselegante, Téo.
- Se achas, por que ainda me procura?
- Porque acho que você precisa de cuidado.
- Não sou criança, ainda não sou velho, pelo que sei sobrevivi por 25árduos anos, acha ainda que necessito de cuidado?
- Vem pra minha casa, Téo. Vamos conversar, há tempos não te vejo, tenho saudades de olhar pros teus olhos.
Desliguei o telefone, odiava melação, queria alguem que colaborasse com os meus palavrões diante do mundo, alguem que apontasse aquelas moças do funk e dissesse algo mais pesado que o que eu poderia ser capaz de pensar ou dizer.Lembrei-me de uma certa vez que um amigo que tive disse que eu era o extremo da maldade, talvez eu não achasse mais alguem capaz de servir o meu vocabulário com coisas novas, neologismo estava fora de cogitação, eu não era mais o surpreendido, a cerveja estava acabando com as minhas idéias, fumei um cigarro, virei o resto da cerveja no chão, a vi escorrendo até o ralo, será que se misturaria com a gasolina, as moças delá me olhavam com caridade e desdem, os rapazes com ironia, a vida me olhava com fervor, as mulheres com dó, os amigos com interesse - em quê não sei! A familia com delicadeza de um viciado, com olhares furtivos e mórbidos, como à espera de um milagre, andava, começara a chover, eram cinco horas da manhã, havia um corpo jogado perto da casa que eu morava, a polícia havia acabado de chegar, não havia tumulto, por uma noite já havia visto o suficiente, o sol apareceria dentro de alguns duradouros minutos, era hora de dormir.
8 comentários:
Seus textos são tão intrigantes como sua personalidade dual.
Que seu 2010 seja melhor...
Abraços fraternais
Pelo menos esse não envolve cocaína. Deve então ter sido um feliz Natal. :)
Dualidade meu caro..
Queriamos mesmo era por fim nessa porra toda, ou morrer em gozo explendido. Temos perguntas que nunca saberemos a resposta e entendimento até demais do efemero que nos rodeia.
que seja eterno enquanto dure, já dizia o poeta.
a geografia por vezes nos impede de dizer o qnt achamos as pessoas importantes. [...]
Se cuida sempre.
^^
Só agora consegui separar escritor do personagem! E olha que eu me acho esperta. Só agora entendi que "Notas de um Velho Chapado" é teu diário; que tudo que há nele, nos contos fantásticos que adoro ler, é a mais pura verdade - vives não a dualidade, mas a ambiguidade. Não é um novo neologismo, como gostarias que te propusessem: é tão antigo quanto. O me deixa mais, e mais, curiosa: quem domina quem? Um velho chapado - por uma doença imunocontagiosa, drogas, sexo e bebida - no corpo de um homem "lindo", adorado pelas mulheres, com 25 anos de idade. Talentoso; um ótimo escritor. Sem mais, descubro o que te fez "envelhecer" tão depressa - e me assusto com tua desistência; com a vontade de morrer, parar de sofrer - e de fazer os outros sofrerem. De repente, descubro que te importas com as outras pessoas; que és capaz de amar; que não és um "poço de maldade", como teu amigo afirma. Eu tentei me aproximar, Téo: falhei! E tu, que és tão falho (tu mesmo o admites), não me perdoa pelo que aconteceu. Daqui, onde estou, a quilômetros de distância, gostaria de fazer algo por ti, um carinho; te colocar no colo, cuidar de ti. Mas esta "merda" de distância... Quando eu conseguir te alcançar, talvez seja tarde: não para mim, ou para ti - para nós dois. Sinto muito, meu querido! Cuida-te! Se precisares de mim, sabe onde encontrar-me. Não vou te desejar Feliz Ano Novo, porque, pelo que dizes, nada vai mudar: é só um virar de folhinha. Mesmo assim, tens o meu amor, sempre. Mesmo que ele de nada te sirva.
me dói ler isso... tanto... tu precisa reagir, querido.
...
"soco no estômago".
assim como você.
Lendo o rindo.
A tempos não passava por aqui.
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