segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Amiga.

Éramos dois corpos numa cama, duas mentes em outro mundo. Ela me dizia que talvez aquilo tudo estivesse errado, eu dizia que aquilo tudo não nos podia fazer pior. Ela dizia que poderíamos ter problemas, eu dizia que poderia ser depois, mas na hora poderíamos ter prazer, ela sorria, eu a beijava, ela prendia, eu libertava. Éramos duas amebas à espera da osmose.
- pega uma cerveja pra gente.
- não pego.
- pega logo essa porra, aproveita e traz um cigarro.
- você acha que sou quem, Téo?
- você é qualquer coisa que se habita, mas você é insana.
- o que isso quer dizer?
- que você é adorável, mas deve ser porque é tão boba quanto.
- só porque beijei sua boca, achas que tens o direito de não me olhar nos olhos?
- acho que você sabe que não somos mais tão amigos assim, Téo.
- então não quero mais sua amizade, quero cerveja e cigarros. E se puder, na volta, me dê um pouco de sexo.
- você acha que sou o quê, Téo?
Levantei, fui à geladeira, peguei uma lata de cerveja, cocei o saco, olhei, não havia nada pra comer, o cinzeiro estava cheio, o amigo dormia no colchão da sala, a janela aberta, um sofá no canto - verde com coisas rosas - era a coisa mais caipiria que havia visto nos ultimos anos, o sol estava alto e forte, as paredes eram azuis, o banheiro era grande, a casa era grande, pensei que poderíamos morar ali, os dois, pensei estar mais louco ainda, acendi o cigarro, queimei o dedo, gritei, mandei alguem tomar no cu - reação instantânea - ela veio correndo ver o que havia acontecido, mandei-a à merda e ouvi o tilintar do anel na lata de cerveja, tomei num gole, caiu um pouco na camiseta dos Beatles que sempre usava, estava descalço, chão frio, de repente pisei na porra do cigarro que havia caído no chão, xinguei a deus agora, uma bolha do caralho no pé e na mão, depois de um banho pus a roupa, escovei os dentes sem pasta - queria beber mais e sem a porra do gosto ruim da pasta na boca - dei um beijo nela, não falei com o amigo que dormia, peguei a bolsa marrom que sempre usava, pus a alça no mesmo lado que o resto, olhei pros céus, o sol ainda estava lá, um pouco de ressaca, sem muito ânimo pra ir embora, fui até o meio da rua, voltei, dei um beijo nela e disse que iria dormir um pouco, pra ela não me incomodar, merda. Mas ela não parava de falar, ela falava muito, lembrei-me da minha mãe,lembrei de todas as outras que tive, eu era um confessionário incrível, desisti de dormir, ela levantou, ligou o som, tocava placebo e enquanto Brian Molko cantava: Without U i'm nothing, ela me beijava.

3 comentários:

Ana disse...

Seria assim se eu estivesse aí? É, seria. rs.

Liliane disse...

Adorei o texto...

Silvia Mendonça disse...

"Éramos duas amebas à espera da osmose." Interessante a frase, ainda mais quando se refere a uma possível transa com uma "amiga". Como sempre te digo, literariamente, o texto é fantástico. Nem Camus era assim! Eu fico pensando: como agirias com alguém que realmente te despertasse amor - se é que és capaz de sentir algo que as amebas possivelmente não conhecem. Faça a mesma pergunta que a Ana: "seria assim se eu estivesse ai?" É, seria... pois não sabes tratar as mulheres de outra maneira; carinhoso, jamais! Pena!